Meus filhos crescem e eu espero. O que faço comigo mesma?

Hoje de manhã, no saguão de um consultório médico me pus a conversar com uma gentil senhora que trabalhava como secretária por ali. Percebendo que eu era estrangeira, ela se interessou em saber um pouco sobre a minha origem e os motivos que me trouxeram para longe do meu país. Não demorou muito para que o assunto se voltasse para meus filhos e para minha vida corrida como mãe de duas crianças pequenas.

 

“Quando seus filhos estiverem grandes você retoma sua vida, sua profissão”, ela me aconselhou, no instante que eu confidenciei meu incômodo de ser somente mãe em tempo integral.

 

“Mas o que eu faço comigo enquanto espero meus filhos crescerem?” foi a pergunta que ensaiei fazer, numa esperança ávida que ela tivesse alguma resposta. Mas a doutora já chamava meu nome e eu tive que me levantar em direção a ela, deixando a pergunta por fazer ecoando dentro de mim.

 

***

 

Eu sei que logo meus filhos vão crescer e vão precisar cada vez menos de mim! Eu sei que, no futuro, terei muito mais tempo disponível para minhas atividades pessoais e profissionais! Mas o que eu faço comigo – com meus desejos, meus sonhos, minhas realizações – enquanto esse fato não vira uma realidade? Devo somente esperar ou fazer algo (o quê?) enquanto espero?

 

Desde que mudei de país tenho dedicado a maior parte do meu tempo a tudo aquilo que envolve meus filhos e sua rotina diária. E essa questão vive batendo à minha porta, sem dar trégua, especialmente quando essa espera se torna real, enquanto aguardo as crianças em suas atividades depois da escola: natação, ginástica, futebol, ballet. Nunca sei muito o que fazer nesse intervalo e a sensação de tempo mal aproveitado é inevitável dentro de mim.

 

Geralmente me sento em uma das poucas cadeiras disponíveis e fico olhando em volta tentando decifrar o que vejo no rosto de cada uma daquelas que, como eu, estão ali para esperar (são pouquíssimos os homens que vejo nessa mesma situação).  Grande parte das mulheres conversam animadas; algumas cochilam e outras se distraem com o celular ou lendo um livro / revista. E eu? Confesso que tento fazer tudo isso, mas não consigo me concentrar em nada.

 

O mais engraçado é que isso acontece não por causa das pessoas e do barulho ao meu redor, mas por causa da inquietude que essa situação de espera provoca em mim. Parece que não consigo ficar confortável. Não consigo relaxar nem tampouco fazer algo produtivo, como se eu estivesse num tempo que não pertencesse a mim. Como se o tempo da espera pelo outro não fosse, legitimamente, meu.

 

Já me perguntei mil vezes porquê me sinto desconfortável nesses momentos. Será que estou tão contaminada assim com o ritmo frenético que comanda nossa forma de existir atualmente e, por isso, sinto pavor do ócio que a espera me proporciona? Ou há algo maior por trás dessa minha inquietude?

 

Minha sensação é que sim, pois essa espera a qual me refiro não é uma espera qualquer, como quando estou na fila do banco ou do supermercado. É um espera de alguns minutos, mas que me remete a uma espera bem mais ampla e profunda, cheia de sentimentos contraditórios, de medos, de apreensões. O prenúncio de um drama inevitável. Enquanto meus filhos aprendem coisas novas, se exercitam, se experimentam, testam seus limites, desenvolvem novas habilidades eles se aproximam mais do mundo e se afastam um pouco mais de mim.

 

Eles crescem e eu espero? É isso que me cabe como mãe? Seria então o dom da espera uma qualidade das mães bem-sucedidas (se é que existe alguma)? 

 

Lembro-me do que mais me chamou atenção ao ler o livro Crianças Francesas não Fazem Manha, da jornalista Pamela Druckerman, foi a observação da autora sobre como as crianças francesas reagem com mais tranquilidade diante da palavra ESPERA, diferentemente das nossas que se debulham em lágrimas ou repetem freneticamente o que querem até serem atendidas.

 

Achei interessante o livro levantar a importância de ensinar as crianças a esperarem pela satisfação de suas necessidades e desejos; a importância delas aprenderem que suas necessidades não são mais urgentes ou importantes do que as dos outros ao seu redor; que sua demanda será atendida assim que o outro tiver disponibilidade de fazê-lo e não de forma imediata.

 

Mas e para mim, mãe? Qual seria o significado da palavra ESPERA? Como faço para saber lidar com tranquilidade com as tantas esperas que a maternidade me impõe? Daquela que se inicia na gravidez para nunca mais acabar? Da espera inevitável imposta pelo crescimento que, ao mesmo tempo que me enche de orgulho, parte irremediavelmente meu coração?

 

Sei que o tempo que dedico aos meus filhos é um investimento que estou fazendo neles. Que esperá-los é dar suporte para que eles cresçam, é proporcionar um terreno firme para que eles possam pegar impulso e saltar para longe. Mas ainda assim, não consigo deixar de pensar no desinvestimento que faço em mim a cada vez que espero. Não consigo me desvencilhar da sensação de que enquanto eles crescem, eu encolho; enquanto eles aprendem, eu envelheço; enquanto eles ganham o mundo, eu perco meu lugar. E tenho medo de passar a vida toda a esperar e não saber mais o que fazer comigo quando a necessidade da espera passar…

 

*  Isabel Coutinho é psicóloga, mãe de 2 filhos e autora do livro MÃE EM CONSTRUÇÃO – reflexões, angústias, desafios (Dash Editora), à venda na loja Somos Mães de Primeira Viagem. Isabel mora atualmente em Nova Iorque.

 

Somos Mãeshttps://somosmaes.com.br/
A Somos Mães é uma ONG e uma empresa do setor 2,5 que nasceu em agosto de 2014. Com o objetivo de informar e acolher, produz conteúdo que impacta diariamente mais de 300 mil pessoas. Tem dois projetos incentivados pela Lei Rouanet.

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