O mundo jurídico é por natureza dinâmico, não apenas moldando a sociedade para direitos e obrigações futuras, como também para adaptá-la a novas circunstâncias sociais. Uma destas circunstâncias, de natureza familiar, está sendo bastante discutida por conta dos reflexos que poderão surgir em vários campos do Direito. Trata-se das chamadas uniões poliafetivas, que são uniões estáveis entre três ou mais pessoas.
Estas uniões poliafetivas (que no caso de união entre três pessoas vêm sendo chamadas de “trisais”) começaram a gerar polêmica a partir de um “trisal” de Belo Horizonte que conseguiu registrar sua união em cartório no início de 2015. Desde então, pelo menos oito escrituras desse tipo foram oficializadas no país, o que chamou a atenção da Corregedoria Nacional de Justiça, vinculada ao Conselho Nacional de Justiça.
A questão do registro de uniões poliafetivas é polêmica não apenas por seus aspectos sociais, mas principalmente por conta de seus reflexos nos campos do direito de família, tributário e previdenciário. Quem poderia registrar um filho havido neste tipo de união como seu dependente para fins de Imposto de Renda? Seria possível um contribuinte declarar seus outros dois cônjuges também como dependentes? E a ordem de sucessão hereditária, como ficaria? E eventual guarda no caso de separação? E o pátrio poder? Estas são apenas algumas questões que certamente precisarão ser esclarecidas caso seja sacramentada a possibilidade de registro destas uniões em cartório.
Um ponto importantíssimo que precisará ser debatido com profundidade pela sociedade é o caráter hipoteticamente ilegal desta forma de união, já que, conforme a maneira em que esta união seja consumada, ela poderia configurar até mesmo o crime de bigamia, e além disso, pode-se até vislumbrar a inconstitucionalidade desta medida, visto que o artigo 226 da Constituição aponta que a família tem como base a união entre duas pessoas.
Foi neste sentido (de ser inconstitucional tal união), inclusive, que a Associação de Direito de Família e Sucessões apresentou um pedido de providências junto à CNJ, para análise da legalidade ou não do registro de uniões poliafetivas.
Neste momento, a CNJ está estudando o caso, e recomendou aos cartórios que aguardam as conclusões deste estudo para então lavrar ou não novas escrituras declaratórias de uniões poliafetivas. Vamos aguardar.